Um feito científico inédito está fazendo a comunidade da física repensar conceitos consolidados há décadas. Pesquisadores liderados pelo SLAC National Accelerator Laboratory, nos Estados Unidos, conseguiram aquecer o ouro a temperaturas superiores a 19 mil Kelvin — cerca de 18.700 °C — sem que ele derretesse.
A descoberta, publicada na prestigiada revista Nature, desafia diretamente a chamada Catástrofe da Entropia, teoria que define o limite máximo em que um material pode permanecer sólido. Desde os anos 1980, essa teoria sustenta que, ao elevar a temperatura de um sólido, suas vibrações atômicas se tornam tão intensas que sua estrutura colapsa, levando inevitavelmente à fusão.
Ouro revolucionário
No entanto, usando lasers ultrarrápidos e feixes de raios-X de altíssima intensidade, os cientistas conseguiram aquecer camadas finíssimas de ouro em trilionésimos de segundo — tão rápido que os elétrons absorveram a energia antes que a rede cristalina tivesse tempo de se desorganizar. O resultado: um estado “superaquecido” em que ouro permanece sólido por uma fração ínfima de tempo, contrariando os limites conhecidos da física clássica.
A equipe internacional envolvida no estudo inclui pesquisadores das universidades de Nevada, Columbia, Oxford, Princeton, Queen’s, Warwick, Califórnia, e do centro europeu de raios-X XFEL. A técnica empregada permitiu observar, com precisão atômica, o comportamento do ouro em condições extremas — algo que, até então, era considerado impossível.
O experimento não apenas quebra paradigmas, como também abre novas possibilidades em campos como fusão nuclear, astrofísica e engenharia de materiais. A pesquisa pode contribuir, por exemplo, para a compreensão de ambientes extremos, como o interior de planetas gigantes, colisões de asteroides ou falhas em reatores nucleares.
Segundo Tom White, professor de física da Universidade de Nevada e coautor do estudo, os resultados não violam as leis da termodinâmica, mas mostram que a física clássica não consegue descrever adequadamente o comportamento da matéria em processos ultrarrápidos.
A velocidade com que a energia é transferidaimpede a reorganização atômica, criando um estado sólido que não deveria existir por tanto tempo — e, mesmo assim, existe”, explicou à Nature.
Bob Nagler, do SLAC, acrescenta à revista: “Se o nosso primeiro experimento já desafiou um princípio estabelecido há mais de 40 anos, imagine o que podemos descobrir a seguir”. Com essa descoberta, a ciência dá mais um passo rumo à compreensão de como a matéria se comporta sob condições extremas — e ao que ainda pode estar escondido nos limites do conhecimento humano.